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quarta-feira, 11 de agosto de 2010

A EVOLUÇÃO DOS MENDIGOS NO CAPITALISMO

     Mendigo é aquele que pede esmolas. Qualquer que seja o trocado (dinheiro) ou o que for doado é lucro. Não há uma taxa imposta normalmente, doa-se o que tiver, porque no caso, já está colaborando com o esmoleiro. No complexo mundo moderno mendigar pode ter uma taxa mínima e pode se tornar emprego; reflexo do sistema econômico que exclui as pessoas e que tem como forte aliado a falta de segurança do Estado para com os cidadãos: cria-se a violência.
     O novo emprego de que estou falando é o de “Guardador de Carros” (ou “olhador de veículos”). Este emprego é fruto do sistema que acabo de mencionar no parágrafo acima: a evolução dos mendigos no capitalismo. A falta de segurança e a de impunidade para as pessoas juntamente com a falta de fiscalização pública aos atos ilegais pela cidade gera uma violência psicológica e faz com que você pague pela taxa estipulada pelo esmoleiro.
     O “Guardador de Carros” é uma pessoa que se passa por um mendigo se apropriando do espaço público para “cuidar” de um bem de terceiro sem nenhuma garantia do serviço prestado. Ou seja, paga-se por um serviço que não se tem garantia se o terá, mas paga-se porque sofre de violência psicológica; essa é uma das várias tentativas de definições para tal atividade, a pessoa e o seu emprego de Guardador de Carros.
     Assim, paga-se para olhar de um bem como se esse estivesse em perigo ou provavelmente sofreria algum dano material como se fosse cabível dizer: “eu vou olhar o que eu quiser e você terá que me pagar porque eu estou trabalhando” (como as nossas casas, com os motoqueiros pelos bairros). Logo estarei andando e alguém estará me vigiando: “eu estava te observando e fazendo a sua segurança, então, depois, deixe uma grana pra mim ‘chefe’, quando for embora”.
     Assim, se apropria de espaço público privatizando-o por um período sem ter uma permissão da Administração Pública e sem pagar impostos. Além disso, cobra a taxa que acha conveniente para o evento como, por exemplo, boate R$ 5,00 e futebol R$ 10,00.
     Assim, paga-se o IPVA, o licenciamento, o alarme e o seguro particular para ainda viver na insegurança de ter que se confrontar com um Guardador de Carros que te recebe em um tom ameaçador.
Como a Administração Pública aceita a ilegalidade, nesse caso e em vários outros, então ela deveria pelo menos legalizar essa atividade cadastrando e conhecendo essas pessoas. Pois, como já visto, a maioria tem passagem pela polícia e seria bom para todos que a Administração fizesse um trabalho social, incluindo essas pessoas novamente no mercado de trabalho. Ou outra alternativa também muito interessante é a da Economia do Equilíbrio: regulariza-se o serviço, contrata-se uma pessoa como um “agente da Área Azul” e o coloca para fazer o mesmo serviço do Guardador de Carros, cobrando uma taxa simbólica (aí será preciso colocar policiamento para fazer a segurança de todos e, principalmente, do agente). Essa taxa se reverteria para o salário desse agente, assim, temos algo regularizado, seguro, sem despesas para a Administração Pública. Além disso, como esse trabalho dará mais dinheiro do que o próprio salário fixo do agente, o que sobrar poderia ser revertido para um investimento do emprego e em bonificações aos policiais da base da região, por exemplo, da central.
     Essa é uma discussão que já deveria ter sido feita, mas nos parece que é muito mais interessante pular o carnaval. Está na hora de parar de mostrar a cidade e começar a enxergar a cidade. Já tem muito tempo que Ribeirão Preto vive da propaganda e provavelmente vai continuar, visto o investimento de 5,9 milhões de reais. Comece lutando para abaixar o álcool; reorganizando a cidade para que todos possam se deslocar da maneira que quiser, de forma segura; reorganize os serviços prestados; faça a fiscalização funcionar, comece... e, voltando a temática, para eu assistir a um jogo no estádio do Botafogo preciso ir de carro porque não tem outro jeito de me deslocar até lá e a dor de cabeça já começa com os R$ 10,00 que eu preciso deixar para os “Guardadores de Carro” como se realmente fosse um serviço seguro. Assim, Copa do Mundo só chegaria aqui por pura propaganda, porque infra-estrutura adequada o município não tem para oferecer nem para os seus moradores. São coisas pequenas que fazem falta no nosso dia-a-dia.

André Barioni (texto publicado no jornal Enfoque Ribeirão, fevereiro de 2010).