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segunda-feira, 17 de janeiro de 2022

De “cartão postal” no século XX, ao abandono no século XXI

O ano é 2022, e vamos falar de uma avenida centenária do nosso município. É a “Avenida Independência”, em Ribeirão Preto, que aliás, merece mais atenção de todos, em especial da gestão municipal. Para comemorar o centenário da Independência do Brasil foi inaugurada em 1922 a Avenida “Nove de Julho”, mas com o nome de Avenida Independência. O seu nome foi alterado em 1934 para Nove de Julho, em mais uma homenagem, agora à Revolução Constitucionalista de 1932[1].

Nasceu pequena, mas percebam que com grandes homenagens, pelo menos nos nomes. O seu trecho inicial compreendia a área entre as ruas Tibiriçá e São José. Os estudos para o seu prolongamento vieram em 1949. Junto, também vieram as Sibipirunas (40 árvores, nativas, Mata Atlântica, de grande porte) e os paralelepípedos, pelo menos entre as ruas Barão do Amazonas e Cerqueira César[2].


Durante a década de 1960 a avenida abrigou algumas das principais mansões de propriedade da elite econômica da cidade; posteriormente em função de sua posição privilegiada (vetor sul da cidade) consolidou-se como um importante setor bancário. Em 1981 existiam 04 agências de bancos internacionais e nacionais instaladas na Avenida Nove de Julho, já em 1987 existiam 12 agências, e no ano de 2000, 25 agências. <https://www.ribeiraopreto.sp.gov.br/portal/arquivo-publico-historico/avenida-nove-de-julho>.

 

Ela continua famosa, linda e charmosa, mas sua importância para a gestão municipal não está à altura. Tanto que na modernização do traçado do transporte público ela não é nem citada. Pelo menos a sociedade não está sabendo. O que temos anunciado por jornais é a construção do primeiro túnel de Ribeirão Preto, passando por baixo da avenida Nove de Julho, para ligar as avenidas Independência e Presidente Vargas. E veja só, essa obra está parada por tempo indeterminado[3].

De uma das mais belas avenidas do interior paulista, das principais mansões abrigando a elite cafeeira, refletindo as influências da Belle Èpoque[4], a ponto de encontro e a prostituição e lazer. Ainda cedo usa-se esta avenida para caminhar, correr e fazer exercícios. Mas nada disso sobrou, nem mesmo a prostituição, que se deslocou para o Boulevard.

De residencial a comercial. Entravam em cena as fachadas e painéis luminosos que não duraram muito. Até recentemente tinha sobrado um exemplar na Casa da Clube, mas que nem isso existe mais. Já foi trocado. Se por um lado ainda resistem os bancos e farmácias, por outro os laboratórios fazem dela um ponto de referência. Tem clube em uma ponta, a sociedade Recreativa e de Esportes de Ribeirão Preto (RECRA), e no seu outro extremo, um grande supermercado. Tem padaria, lojas, restaurantes, entre tantos outros comércios. Mas também tem muitos imóveis parados, aguardando para serem alugados ou vendidos. E está assim por estar abandonada! É um reflexo.

Dividida por uma obra parada, temos duas histórias distintas para uma mesma avenida. Para um lado, paralelepípedos malconservados, calçadas públicas do canteiro central (mosaico português) depreciadas e um tráfego de veículos quase extinto. Este é o lado dos bancos. Tal situação parece até proposital. Por sorte, a avenida é tombada e resiste ao recapeamento, desejo de muitos por aqui[5]. Lembrando que paralelepípedo é muito melhor que asfalto, pois diminui a velocidade, é mais ecológico, possui maior durabilidade, é mais resistente ao tempo e favorece o escoamento da água, além de fácil manutenção, apesar de ouvirmos o contrário da boca daqueles que querem arrancá-los. Para o outro lado, asfalto esburacado a cada chuva, cheio de deformações provocadas por anos de recapeamento de buracos e sem sinalização adequada para pedestres. E o calçamento central, uma lástima. Talvez, a única coisa comparável em ambos os lados.

Em 2012 divulguei matéria neste blog[6] apontando a falta de sinalização na Avenida Nove de Julho e as dificuldades que os pedestres tinham pela frente. Após 10 anos, retorno aqui para uma nova nota para mostrar que aqueles problemas não foram resolvidos e, agora, pior, o abandono é geral, daquela que já foi considerada um “cartão postal”. Vamos aos detalhes.

A Figura 01 é um bom exemplo de falta de sinalização, em especial para os pedestres. Não há faixas ou semáforos que possam ser utilizados pelos pedestres. As folhas amarelas no chão são lindas, e devem manter as árvores, mas estas flores viram um tapete escorregadio. Nessa esquina, temos dois laboratórios atendendo muitas pessoas, em especial idosos.

 

Figura 01 - Cruzamento da Nove de Julho com a rua Vicente de Carvalho

Fonte: Google Maps

 

Na Figura 02, a situação é idêntica à anterior. Aqui temos um cruzamento com laboratório, hotel e agência bancária, estabelecimentos que, pelos serviços que oferecem, atraem muitas pessoas. E certamente, em algum momento, elas serão pedestres. Além disso, algo constatado já há algum tempo, em nenhuma das duas figuras são mostradas lixeiras. São praticamente inexistentes ao longo da avenida[7].

Devemos lembrar que o traçado urbano muitas vezes é lembrando nos livros de história, porém aparece ligado a outros fenômenos, como enchentes, casarões, homenagens, entre outros, mas não temos uma descrição dos planos de circulação e mobilidade. São raros os mapas, mesmo sabendo que Ribeirão Preto sempre foi um município importante: moradia dos barões do café, Califórnia brasileira e hoje, a capital do agronegócio, só para citar alguns rótulos famosos por sua economia.

 

Figura 02 - Cruzamento da Nove de Julho com a rua Guimarães Passos

Fonte: Google Maps

 

Tudo bem que esta preocupação com o traçado urbano veio em tempos recentes, com ênfase dada pela última constituição. Contudo, ainda hoje não vemos uma descrição quando o assunto é o futuro das cidades. São vários debates realizados, organizados tanto pelo setor privado quanto pelo público e ficam sempre nos assuntos tradicionais, políticos: educação, turismo, economia, segurança etc. Não que não sejam importantes, mas a mobilidade urbana precisa integrar todos estes assuntos. Hoje Ribeirão Preto é um canteiro de obras, tudo isso para trazer a “modernidade” de faixas exclusivas ou prioritárias para ônibus? Acho que os prefeitos do começo do século XX tinham visões mais progressistas. Tínhamos que falar hoje em VLT (Veículo Leve sobre Trilho).

Mas não, vamos continuar priorizando o automóvel. Por isso, as Figura 03 e 04 são simbólicas, da obra do primeiro túnel de Ribeirão Preto. Cidade moderna por aqui é formada por túneis, viadutos, pistas largas e semáforos para os automóveis, enquanto mundo afora é formada por ciclovias e ciclofaixas, arborização urbana, integração do transporte coletivo elétrico e investimento pesado no uso dos veículos não motorizados.


Figura 03 – Obra de túnel paralisada, dividindo a Avenida Nove de Julho

Fonte: www.acidadeon.com/ribeiraopreto/cotidiano/cidades/NOT,0,0,1619496,Obra-de-tunel-em-Ribeirao-esta-parada-por-tempo-indeterminado.aspx

 

Figura 04 – Obra de túnel paralisada em Ribeirão Preto

Fonte: https://bit.ly/3FtEjjx

 

Nas figuras seguintes, verifica-se um pouco daquilo que já foi mencionado aqui. O descaso com o conserto dos paralelepípedos para a sociedade, no futuro, apoiar a troca deste tipo de pavimento por asfalto. As folhas amarelas das Sibipirunas que deixam o chão escorregadio e perigoso. A falta de sinalização para pedestres e de lixeiras deste lado da avenida. E um quarteirão de imóveis fechados muito provavelmente por conta deste abandono. O que sobrevive aí desempenha um papel de atração de consumidores de outros lugares, como bancos, restaurantes (alguns fastfoods) e laboratórios ou dependem dos estabelecimentos que empregam ou movimentam muitas pessoas, como é o caso da RECRA, da Diretoria Regional de Ensino, das escolas e dos hospitais.

 

Figura 05 – Pavimento desnivelado na Avenida Nove de Julho

https://www.marcospapa.com.br/wp-content/uploads/2018/08/9-de-julho-Revide.jpeg

 

Figura 06 - Pavimento desnivelado cria poças d’água que podem espirrar nos pedestres

https://emc.acidadeon.com/dbimagens/nove_de_1200x675_01122021171056.jpg

 

Figura 07 – Folhas das Sibipirunas que se acumulam no chão

https://media-cdn.tripadvisor.com/media/photo-s/0a/b4/41/78/dsc-0008-2-largejpg.jpg

 

Figura 08 – Avenida Nove de Julho sem sinalização para pedestres

https://mapio.net/images-p/21960220.jpg

 

Figura 09 – Estabelecimentos fechados para alugar

Fonte: Google Maps.



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